ESPAÇO PRÉ-INDUSTRIAL: A ECONOMIA DE ARQUIPÉLAGO
“Uma longa fase se entende a inserção do país na divisão internacional do trabalho, no século XVI até as primeiras décadas do século atual caracterizada por uma economia agrário-exportadora”.
Do ponto de vista da organização espacial, essa fase produziu um território nacional que no começo do século XX se apresentava essencialmente desarticulado, os autores que têm escrito sobre o Brasil associam essa desarticulação à idéia de arquipélago econômico (..) o país possuía uma economia nacional formada por várias economias regionais.
Não existia, de fato, uma divisão regional interna do trabalho em dimensão nacional. As diversas regiões se ligavam diretamente a centros do capitalismo mundial. Tinham em comum um crescimento para fora.
A expansão da economia cafeeira em áreas do atual Brasil do Sudeste, a partir das primeiras décadas do século XIX, adquire expressão no comércio internacional em meados do século, criando uma economia dinâmica (...). Constitui-se essa região Sudeste em um mercado de consumo que criou as condições para a penetração de produtos industrializados pelos portos de Santos, do Rio de Janeiro e para o desenvolvimento do comércio e de uma classe de comerciantes importantes nessa praça e em São Paulo. Permitiu, também, a penetração por cabotagem ou vias internas de produtos alimentícios que levara a formação de economias (e espaços) complementares (...).
(Lea Goldstein e Manoel F. G. Seabra. Divisão Territorial do Trabalho e nova regionalização. Apud MAGNOLI, 1992)
O texto refere-se à organização da economia brasileira agrário-exportadora, assim caracterizada:
· Monocultura de exportação (cana-de-açúcar, algodão, cacau, café, além do pólo da borracha);
· Fraco comércio interno;
· Grande importação de produtos industrializados, principalmente para o Sudeste;
· Poder político e econômico centralizado nas mãos dos “barões do café”;
· Concentração populacional nas áreas rurais (campo);
· Concentração da terra (latifúndios) nas mãos de grandes latifundiários;
· Desarticulação regional.
A INDÚSTRIA NO BRASIL
Costuma-se dizer que a indústria brasileira nasceu tardiamente e na dependência de tecnologia externa, pois o primeiro surto industrial do Brasil ocorreu um século depois de deflagrada a Revolução Industrial (segunda metade do século XVIII).
Para MAGNOLI (1992), a industrialização brasileira pode ser dividida em duas etapas históricas: “o primeiro surto acompanhou o crescimento da economia cafeeira capitalista de São Paulo”. Considera a Revolução de 30 o concentravam no Oeste paulista. Por que essa concentração industrial em São Paulo? Eis os principais motivos:
1) A economia cafeeira gerou um mercado consumidor interno (classe média, trabalhadores e imigrantes);
2) A concentração da força de trabalho (imigrantes, nas épocas de crise do café);
3) A infra-estrutura ferroviária que servia à região cafeeira (transporte de carvão e ferro para as indústrias);
4) A concentração de capitais (exportação de café);
Vejamos como se estabelecia a relação entre a economia cafeeira dominante e a economia industrial crescente:
a) Crise de superprodução do café e queda do preço no mercado mundial:
1) Recuo da plantação;
2) Êxodo de trabalhadores para as fábricas;
3) Queda das exportações;
4) Crescimento da indústria, via empréstimos bancários;
b) Recuperação cafeeira:
1) empréstimos bancários para as plantações;
2) importação de produtos industriais (melhores e mais baratos);
3) crise e falência dos seringais.
O início da segunda fase da industrialização é marcado pela crise da Bolsa de Nova Iorque (1922). Essa crise provocou uma contração dos mercados consumidores dos países desenvolvidos e derrubou os preços das mercadorias de exportação dos países de economia agrária, como o Brasil. Os reflexos dessa crise no Brasil foram desastrosos: além da queda do preço do café, cai também a oligarquia cafeeira, derrubada pelo movimento revolucionário de 1930. A classe média e a burguesia comercial chegam ao poder juntamente com Getúlio Vargas.
No período de 1930 até a Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945) ao mesmo tempo em que freou o crescimento industrial, devido à redução das importações de máquinas e equipamentos, estimulou a substituição dessas importações por produtos nacionais. A “Era Vargas” foi a “Era das indústrias nacionais”: em 1941 é criada a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN); em 1942, cria-se a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD).
“No pós-guerra, a criação da indústria de bens de produção voltaria a se associar ao nome de Getúlio Vargas. Em 1951 é inaugurada a Usina de Paulo Afonso (...). Em 1953 surgia a Petrobrás e, com ela, um gigantesco esforço voltado à produção, o refino e o transporte do petróleo organizado sob o signo do monopólio estatal.”
(MAGNOLI, 1992)
A partir da década de 50 a industrialização brasileira sofreu uma forte aceleração. No governo de JK é reorientada a política industrial brasileira, enfatizando-se a abertura do país aos investimentos estrangeiros diretos. O seu “Plano de Metas” (50 anos em 5) tinha como fundamento a implantação de um sólido parque automobilístico, com a tecnologia dos EUA e da Europa. O governo brasileiro estimulou os investimentos estrangeiros de várias maneiras: liberando as importações de máquinas e equipamentos, criando mecanismos de créditos, instalando programas rodoviários,
energéticos e siderúrgicos, dentre outros. As firmas estrangeiras também estavam interessadas na exploração das matérias-primas e da mão-de-obra brasileira (forte e mal remunerada).
Esse processo de industrialização dependente e acelerado que vai do pós-guerra até meados da década de 70, caracterizada a ruptura com o modelo agroexportador e encerra a fase típica de substituição de importação (produção interna dos bens industriais que antes eram importados).
A DIVISÃO DO TRABALHO NA ECONOMIA INDUSTRIAL
Quais foram as conseqüências desse processo de industrialização?
Leia atentamente os textos transcritos e tire suas conclusões:
“... A concentração industrial no Sudeste transformou toda a economia do país, criando um mercado interno nacional. O Sudeste”.
Os manufaturados do Sudeste, produzidos com tecnologia superiro e em escala industrial , invadiram todo o país. A competição desigual com as mercadorias fabricadas nas outras regiões resultou no predomínio da indústria no Sudeste.”“.
(Magnoli, 1992)
“Com a industrialização começa a ocorrer uma integração do território: a criação de um espaço industrial. A nova forma de organização do espaço orienta-se segundo um esquema de centro a periferias”.
O centro econômico do Brasil, bastante urbanizado e industrializado, é constituído por São Paulo e Rio de Janeiro (...)
O restante do país é constituído pelas várias periferias, algumas mais industrializadas e a grande maioria com economia baseada na agropecuária ou na mineração. As periferias recebem do centro produtos industrializados e fornecem a ele mão-de-obra e matérias-primas ““.
(Versertini, 1989)
Podemos observar que São Paulo e Rio de Janeiro passaram a comandar o mercado nacional, constituindo em todo território regiões que passaram a se articular por meio de suas especialidades. Surge uma divisão do trabalho na economia nacional, assim caracterizada:
· o Centro-Sul tornou-se a região mais industrializada e urbanizada do Brasil e surgiu como expressão de modernidade e de integração econômica;
· o Nordeste caracterizava-se como região de economia deprimida e como área de emigração intensa para o Centro-Sul. A crise social e bolsões de miséria marcam o espaço geográfico nordestino.
· A Amazônia parece como imensa reserva povoada e como futura fronteira de expansão da economia industrial nacional.
Finalmente analisaremos o processo de urbanização do Brasil.
Embora a lavoura cafeeira tenha contribuído para a formação de pequenas e médias cidades, o processo de urbanização do país tem início no século XX, com a industrialização.
A indústria passou a atrair uma grande quantia de pessoas que migram (saíram) do campo para a cidade, dando início a urbanização. A partir de então, a população das cidades passou a crescer mais que a população rural do país. Exemplificando: de 1970 a 1991 a população urbana brasileira passou de 56% para cerca de 74%. Quais as conseqüências dessa urbanização acelerada?
Como vimos, o processo de industrialização desencadeado a partir de 1930 transformou o espaço geográfico brasileiro. A concentração populacional no espaço urbano, a ascensão política da burguesia industrial e comercial, a criação de um mercado interno integrado e dependente do Centro-Sul, a concentração industrial (e no poder econômico) no Sudeste, o assalariamento quase generalizado da força de trabalho, são algumas conseqüências da industrialização do Brasil.
A (re) organização do espaço interno brasileiro, no qual o centro econômico nacional (Sudeste) comanda as outras regiões (periferias), é uma reprodução da organização espacial do capitalismo mundial, no qual existem o centro (países desenvolvidos) e a periferia (países subdesenvolvidos). Como nos diz Versetini (1989):
“Devemos ter em vista ainda o fato de que o centro econômico nacional, quando considerado sob um ângulo internacional, na realidade é uma parte da periferia do sistema capitalista como um todo, cujas metrópoles mundiais são Nova Iorque , Tóquio, Londres, Berlim, Paris e outras.”
O BRASIL NA ECONOMIA GLOBAL
BRASIL, PAÍS SUBDESENVOLVIDO INDUSTRIALIZADO
As décadas do pós-guerra conheceram um crescimento sem precedentes da economia mundial. Sob a liderança dos Estados Unidos, as reconstruções européias e japonesas forjaram uma profunda integração internacional dos mercados e uma forte expansão da produção.
Simultaneamente, ocorria uma mutação estrutural no funcionamento da economia capitalista, com a descentralização geográfica da indústria. O conglomerado industrial transnacional americano, europeu e japonês transpunha as fronteiras políticas da periferia do mundo capitalistas. Um grupo seleto de países subdesenvolvidos ingressava na economia industrial moderna.
Antes da Segunda Guerra Mundial, a América Latina, a Ásia e a África apresentava um duplo interesse para os capitais dos países desenvolvidos: constituíam mercados consumidores de manufaturados e fornecedores de matérias-primas e produtos agrícolas. Os investimentos estrangeiros diretos dos países subdesenvolvidos praticamente limitavam-se aos setores ferroviário e elétrico, á mineração e às plantations.
No pós-guerra, um grupo de países subdesenvolvidos aparece como alvo de investimentos estrangeiros diretos no setor industrial. A antiga paisagem homogênea da periferia capitalista – formada por exportadores agrícolas e minerais – começava a se diferenciar. Países como o Brasil, o México, a Argentina, o Chile e a África do Sul sofrem vastas transformações na estrutura das suas economias, trocando o modelo econômico baseado na exportação agrícola ou mineral pelo modelo urbano-industrial.(fig.01)
A descentralização geográfica da industria mundial gerou uma industrialização seletiva, restrita a um número mais ou menos reduzido de países. Os países que atraíram investimentos de países diretos de capitais transnacionais ofereceriam vantagens em três níveis principais; A sua força de trabalho, fracamente qualificada e em organizações sindicais poderosas, apresentavam custos muitos inferiores aos dispendidos como a mão-de-obra dos países desenvolvidos. O processo de urbanização gerava um mercado interno relativamente amplo, capaz de absorver uma oferta crescente de bens de consumo duráveis como automóveis, eletrodomésticos, eletrônicos, etc. A etapa econômica anterior, fundada no modelo exportador originara infra-estruturas de transportes e comunicações, facilitando a circulação de mercadorias.
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